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segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Novos Partidos-Velha política.


Jamais recebi tantas mensagens pelo Twitter quanto recebi no dia 21 de março. Naquele dia, o recém-fundado Partido Social Democrático (PSD) anunciara as bases programáticas sobre as quais o partido seria construído. Escritos pelo vice-governador de São Paulo, Guilherme Afif Domingos, os doze mandamentos do partido o posicionava em um campo da política que hoje está deserto no Brasil. Segundo eles, o partido defenderia a liberdade individual e a liberdade para empreender; a descentralização do poder e o direito de propriedade; a igualdade de oportunidades e a livre associação entre indivíduos.

As mensagens que chegavam eram de amigos animados com o surpreendente liberalismo da legenda. Para os mais otimistas, o PSD poderia ser a união das ideias fiscais de Afif Domingos, que há tempos milita pela diminuição da interferência do estado na economia; e da potencial tolerância social de Gilberto Kassab, prefeito reeleito de uma das maiores metrópoles do mundo; político que fora favorável à realização da Marcha da Maconha e já discursara na Parada do Orgulho Gay de São Paulo.

No ato de fundação do partido, quando perguntados sobre o posicionamento político do PSD, seus líderes responderam que ele dependeria do programa a ser formulado, baseado nos mandamentos escritos por Afif Domingos. No entanto, não tardaria até que o significado das declarações se tornasse cada vez mais amplo, enigmático e incoerente. Gilberto Kassab relegou qualquer direcionamento programático a um futuro acordo entre os integrantes do partido. Afif Domingos passou a falar em subsídios para empresas privadas e declarou que o corte de gastos do governo não era prioridade para o PSD. A senadora Kátia Abreu, liderança com declarações políticas mais consistentes, passou os últimos meses ocupada com o debate da Reforma Florestal e desapareceu das discussões partidárias.

Por melhores que tenham sido as intenções de seus líderes ao formularem os direcionamentos ideológicos do partido, é impossível esperar qualquer identidade de uma agremiação que recebe políticos egressos de campos tão distintos. Parlamentares vindos de PDT, PV, PPS e PP têm pouco em comum, além da disposição de procurar um posicionamento melhor em suas disputas municipais e estaduais. Antes mesmo da primeira eleição, o PSD abandonou a fidelidade aos seus próprios mandamentos e iniciou sua caminhada rumo ao centro da política brasileira -- onde todos os partidos e políticos são bem-vindos. No centrão, vale tudo para melhorar a representação do partido em um estado ou por uma secretaria qualquer. É lá que moram os deputados do baixo-clero e aqueles que peregrinam de partido em partido, tentando não acabar do lado errado da alternância de poder.

A capacidade desses partidos de se adaptarem a qualquer cenário político e a ausência de identificação entre o centrão e um conjunto claro de políticas públicas, geram no país situações peculiares como a do PTB que apoiou politicamente todos os governos federais desde a sua refundação no início dos anos 1980; do PMDB que indicou candidata à vice-presidência na chapa de José Serra em 2002 e indicou candidato ao mesmo cargo contra o próprio José Serra, oito anos depois; ou mesmo do PP, que talvez tenha em Paulo Maluf o seu único nome de projeção nacional, mas que, com a força dos 41 deputados de sua bancada na Câmara e seus seis senadores, consegue manter refém um governo formado pela coalizão dos dois maiores partidos do país, sob a liderança de uma presidente eleita com mais de 55 milhões de votos.

O liberalismo do PSD foi natimorto. O partido preferiu nascer grande a nascer coerente e unido. Sem um conjunto de ideias que lhe sustente, ele será inevitavelmente retalhado de acordo com interesses de caciques locais, os mesmos que hoje pulam para o barco do partido em busca de espaço político. Os mandamentos liberais da fundação do partido já parecem esquecidos. Não existem diretrizes que possam atrair o interesse dos eleitores. A definição das políticas é posterior à busca por nomes de peso e políticos se associam sem ter um programa que os una. Sem saber exatamente o que defendem, acabam por defender a si próprios.

A literatura política do Brasil acabará por contar a história dos milhões de eleitores cujas inclinações políticas foram, por gerações, ignoradas pelos partidos tradicionais. A classe média brasileira dobrou de tamanho nos últimos anos. Hoje, ela é jovem e vive nas grandes cidades. Ela deseja mais liberdade para empreender, trabalhar e se expressar. Ela trabalha e troca informações no caos espontaneamente organizado da internet. Ela deseja menos intervenção governamental na sociedade. Ela prefere viver e deixar viver.

Jovens e recentes pagadores de impostos, esses eleitores buscarão um partido que os represente. O PSD teve a chance de sair na frente, de encontrá-los enquanto os maiores partidos do Brasil disputam o espólio das políticas social-democratas dos anos 1990. Para esses milhões de eleitores, e para meus animados e esperançosos amigos, restarão mais alguns anos de espera, até que apareça uma alternativa ao projeto de país que PT e PSDB compartilharam nos últimos 17 anos.


Magno Karl, cientista social pela UFRJ, é tradutor e assistente de pesquisas de OrdemLivre.org.

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